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Hoje decidi-me sentir bonita. Sentir-me bem comigo mesma. É tão raro faze-lo ultimamente.

"Deus" sabe como este ano tem sido difícil para mim. Na ausência dos problemas do costume (i.e. família destroçada, encalhamento permanente, cansaço escolar), decidi inventar os meus próprios problemas. É sabido que sendo Maria João Brito estar plenamente feliz e satisfeita é um tédio, e uma condição impossível de manter por mais que alguns fugazes momentos.

Por isso agucei o meu perfeccionismo e daí em diante almejei a ideais que alcançáveis ou não me impunham regras e princípios cujo cumprimento era do mais vital para mim. Mas essas "leis absolutas" de como eu deveria viver a vida, restringiam-me, e ainda restringem. 

A antiga miúda que nos testes psicotécnicos tirava 1 em 10 no parâmetro do "cumprimento de regras" e 3 no "perfeccionismo" tinha-se tornado numa neurótica.

O pior é que grande parte do meu ideal de vida era inalcançável, e isso resulta numa tremenda frustração. Ninguém me compreendia, tirando o meu amigo Pessoa, que se não fosse o facto de ter morrido no século passado, teria sido um fantástico companheiro de devaneios acerca da soberba inutilidade da vida. E devia dar para apanhar umas sublimes bebedeiras com ele, também. Ora, sentindo-me apenas compreendida por poemas poeirentos de um louco morto e enterrado, lá me fui fechando sobre mim mesma... Um novelo enrolado para o lado de dentro.

A anti-sociabilidade que daí surgiu durou por uns longos meses, se não é que dura ainda. Deixei de ter paciência para as piadas, conversas e brincadeiras que sempre me divertiram... E se já antes era propícia a ser odiada com base na primeira impressão que a minha personalidade demasiado vincada deixa, a minha indiferença agravou o caso. Se já era insuportável, ainda mais insuportável fiquei.
E os outros, as pessoas, os amigos, eram insuportáveis para mim.

Se se estavam a perguntar porque é que eu tinha desaparecido do mapa, aí têm a explicação.

O único que ficou, ou o único a quem eu permiti ficar, foi o meu namorado, que dotado de uma paciência incrível lá ia lidando com os meus maus-humores, dramas e crises. Tempos negros, de facto.

Mas hoje estou melhor. Mais bem disposta. Há já alguns meses que me tenho vindo a libertar gradualmente dos meus complexos. A sentir-me um bocadinho melhor em ser eu. A aceitar que não posso ser outra pessoa.

Ainda assim, o que antes me sustentava tem-se vindo a degradar. Se antes estar com ele era melhor do que qualquer outra coisa que eu pudesse fazer (e por isso desisti de tudo o resto), hoje simplesmente não é suficiente*. A paciência dele para mim esgota-se cada vez mais rapidamente e idem quanto a minha para ele. As discussões e desentendimentos multiplicam-se. Palavras pontiagudas são atiradas, a ver quem fere mais o orgulho do outro. E assim se passam umas horas até tudo acabar em lágrimas e pedidos de desculpa e promessas que não podem ser cumpridas. Hoje que fazemos um ano e três meses, é só mais um desses dias maus que se têm vindo a tornar mais frequentes.

Mas hoje estou determinada a sentir-me bem comigo mesma, sabem? Tomei um longo duche, lavei o cabelo e esfreguei o corpo escrupulosamente, para me sentir imaculada. Espalhei creme no corpo, e até nos pés (esses pobres sacrificados que eu deixo gretar por não gostar deles) na esperança que amaciasse um pouco não só a minha pele como a minha alma. Pintei as unhas, ter as mãos bonitas prepara-as para a acção. E olhei ao espelho. Não me senti linda, é raro sentir. Mas não me senti horrível de todo, o que é um progresso em relação a ontem.

Olhei ao espelho. Tenho uma porta de oportunidades à minha frente. Abrir-se-á em um mês. Para quê agarrar-me tanto ao passado, se tenho a promessa de um futuro? Levo-o ao colo, na esperança que não se desintegre. Mas, caramba, se isso acontecer, tenho um mundo novo para agarrar. No entanto, aqui ando eu, de mãos ocupadas.

Olhei ao espelho. Tinha dedicado um tempo a mim, mas a mim mesmo, não à minha vida nem àquilo que nela se passa, para isso já sou egocêntrica que chegue nos dias normais. Olhei ao espelho e vi alguém que pode efectivamente ser independente e fazer algo de realmente brilhante. Olhei ao espelho e vi alguém que tem estado abafada por ninguém mais que ela mesma. Olhei ao espelho e vi possibilidades e sonhos e ambições.

Nunca deixarei de ser perfeccionista. Nunca deixarei de querer mais. Deixem-me ser assim, e pode ser que eu o aplique na direcção certa.

E desculpem pelos posts deprimentes. Eu prometo que o próximo será melhor.

* Edit após resolver discussão com o respectivo: Não é que não seja suficiente, eu gosto de estar com ele, é a melhor parte do meu dia, mas porra, estou tão farta de fazer as mesmas coisas e ir aos mesmos sítios... É mais estar farta desta cidade e ansiar desesperadamente por mais, por poder partilhar novidades e experiências novas, por ter algo divertidíssimo por fazer. O que não quer dizer que estarmos juntos é uma seca. É só que eu sou gananciosa: quero sempre mais e o que tenho nunca chega.







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